No passado mês de Fevereiro do corrente ano, já aqui mencionei o programa acima referenciado, da TSF.
Agora escolhi mais este, entre tantos outros, porque me tocou e porque estamos a atravessar uma época em que pessoas corretas, dignas, com caráter e com "espinha dorsal" estão praticamente em vias de extinção...
Uma velhota humilhada, um assessor em bicos dos pés e um ministro capaz de tudo
1. Ontem de manhã, na estação de Sete Rios, em Lisboa, três adolescentes divertiram-se com uma velhota que lhes pediu um lugar para poder descansar as pernas.
Estava carregada a senhora. Dois grandes sacos que a obrigavam a um passo lento e pesado. Não havia cadeiras vazias na estação e ela perguntou com bons modos, mas a resposta foi uma sonora gargalhada.
Que procurasse outro lugar, havia milhares em toda a estação. Aqueles três adolescentes olhavam sem ver, tenho a certeza absoluta de que não colocaram sequer a ideia de que aquilo que faziam era terrível e indecoroso.
Algumas pessoas insurgiram-se contra os miúdos. Lá se levantaram, não sem antes terem soltado duas ou três alarvidades.
O que te conto não é notícia.
Todos já vimos e ouvimos coisas do género.
2. Mas esta amoralidade é mais funda do que possa parecer.
Uma amoralidade que não é um exclusivo das pessoas sem educação que não conseguem disfarçar a maldade ou a total incapacidade de ter empatia, ou respeito por quem deveria merecer respeito.
O que se passou ontem e está a passar hoje com a comissão de inquérito é simplesmente vergonhoso e tem tudo a ver com o que antes contei.
As respostas do ex-adjunto de um ministro da República aos deputados da comissão foram chocantes. A maneira como pôs tudo em causa diz muitíssimo sobre a degenerescência do nosso tempo.
Frederico Pinheiro era um adjunto de um gabinete do Governo.
Independentemente da sua razão ou da falta dela, e tendo em conta que a Pátria não estava em risco, deveria ter feito o que é a sua obrigação, a mesma que um padre tem quando respeita o segredo da confissão ou um jornalista a identidade das fontes.
Ver Frederico Pinheiro a falar da maneira como falou é o sinal de um tempo. Toda a gente publicita a sua opinião, toda a gente se leva a sério e deseja protagonismo, toda a gente se acha importante, toda a gente desrespeita hierarquias.
3. Mas se ouvir Frederico foi grave e sintomático, escutar João Galamba depois da comunicação de Marcelo Rebelo de Sousa é penoso e angustiante.
Como teve a lata de se manter depois do que o Presidente afirmou sobre si numa comunicação ao país?
Pensei sinceramente que não fosse possível, não me parecia possível - com pressão ou sem pressão do primeiro-ministro.
Esperei uma hora, dois dias, uma semana.
Vi-o sorridente e arrogante a responder aos jornalistas e concluí que o mundo está definitivamente louco.
Porque um homem que se mantém no Governo depois do Presidente da República ter dito o que disse é alguém que é capaz de tudo ou quase tudo para se manter à tona, para se manter como ministro, para sobreviver.
4. Estes três episódios são parte do mesmo.
Os três rapazes que insultaram a velhota, o assessor que desafiou o primeiro-ministro e contou segredos e o ministro que desrespeitou o Presidente da República, fazem parte deste caldo cultural que nos poderá levar à ruína e a uma decadência civilizacional irreversível - com tudo o que isso inevitavelmente trará.
Muito triste o que está a acontecer.
Fala-se muito de corrupção e ganância, mas fala-se menos de caráter. E as duas coisas são importantes. Porque as duas corroem a democracia, porque as duas rebentam o dique que nos protege da barbárie.
Vemos isso transversalmente.
Nos pequenos e grandes pormenores.
Entre os ricos e entre os pobres.
Entre os poderosos e os que não têm poder algum.
É preciso meter o travão de mão.
E caro António Costa, não dá mais.
Tem mesmo de governar e pôr ordem na casa.
Deixe a tática de lado e faça o que tem a fazer.
Faça-nos acreditar outra vez ou saia.
Meu comentário:
"Falta de caráter" devia ser o título deste "Postal"... Não poderia estar mais de acordo!
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